Participações contra a realização da Conferência promovida pelo BCE em Portugal no dia 25 de maio
A Comissão, por maioria dos Membros com os votos contra dos Senhores Drs. Domingos Soares Farinho, Álvaro Saraiva, João Almeida e Carla Luís, tomou a seguinte deliberação:
“Transmita-se aos participantes que a CNE tem o entendimento de que, na realização do evento em apreço, não se encontra em causa matéria eleitoral, pelo que, considera não dever intervir.”
O Senhor Dr. Domingos Soares Farinho apresentou a seguinte declaração de voto:
"Votei vencido quanto ao sentido da deliberação em apreço uma vez que entendo que, podendo o teor das intervenções da Conferência em análise suscitar dúvidas quanto à subsunção desses factos à categoria jurídica de propaganda indirecta, deveria a Comissão Nacional de Eleições ter apreciado a (possibilidade de) verificação ou não dessa mesma propaganda indirecta e não, liminarmente, ter rejeitado a sua própria competência."
O Senhor Dr. Álvaro Saraiva apresentou a seguinte declaração de voto:
“Votei de vencido na proposta de deliberação por achar que a conferência em causa aborda problemas, temas e questões que estão na ordem do dia e logicamente estão ligados com a situação politica que se vive na Europa.
Aliás quando a conferência foi agendada já as eleições para o PE estavam marcadas, por conseguinte o BCE e a organização deveriam ter o cuidado de fazer deslizar o agendamento da conferência.
Por mais argumentos que se procurem para justificar a iniciativa, o processo mediático está montado e em curso.”
O Senhor Dr. João Almeida apresentou a seguinte declaração de voto:
“Ou é mentira ou sobranceira ignorância com flagrante desrespeito pelos institutos e instituições democráticos – a conferência do BCE foi marcada cerca de dois meses depois de ser conhecido o período em que teriam lugar as eleições para o PE, fixado em Junho de 2013 pelo Conselho para 22 a 25 de Maio de 2014. Em Portugal, seriam obrigatoriamente a 25 de Maio, como o vão ser.
Também não corresponde à verdade que este seja um evento regular: é a primeira vez que se realiza e os organizadores pretendem que seja regular, mas no futuro.
Espanta-me tanto que não sei como contestar a afirmação lapidar que mereceu a maioria dos votos de que as temáticas de políticas monetárias, de regulação e supervisão e a presença dos mais destacados dos participantes não são política nem políticos e, portanto, estando em estreita conexão com as políticas económicas, financeiras e orçamentais nacionais e europeias e no cerne do debate eleitoral, não são matéria eleitoral. Creio que o meu espanto é, neste momento, partilhado pela generalidade dos cidadãos que tiveram acesso à deliberação aprovada.
Preocupa-me que, em resultado de tão espantosa conclusão, tudo e todos possam comentar o cerne da política nacional e europeia em nome, a propósito ou a respeito do BCE, do FMI, da Comissão Europeia ou das suas políticas apolíticas e, sobretudo a 24 e 25 de Maio, as candidaturas, os candidatos, os proponentes das candidaturas, os seus dirigentes e agentes estejam, por lei, proibidos de o fazer. Este era um espaço adequado a uma renovada reflexão kafkiana!
Por fim, lamento – têm sido pacíficos, em geral, os processos eleitorais e os comportamentos dos agentes políticos, mas a sucessiva abertura a factos e comportamentos que, não a violando, defraudam a lei, contornando-a de forma mais ou menos flagrante, é um caminho perigoso que preferia não ver trilhado.
Por tudo isto propus que a Comissão exprimisse o seu desagrado pela realização deste evento nesta data e votei contra a proposta que fez vencimento.”
A Senhora Dra. Carla Luís apresentou a seguinte declaração de voto:
“Em primeiro lugar, esta Conferência aborda questões que estão no cerne do debate sobre as instituições europeias e respectivo posicionamento sobre as mesmas. Ou seja, são opções políticas – e não exclusivamente técnicas – que vão estar em debate, debate esse que é desejável que se faça, mas no âmbito da campanha eleitoral e das diversas propostas políticas que são apresentadas. É absurdo, portanto, dizer que “não se encontra em causa matéria eleitoral”.
É também desleal, e constitui um abuso da posição institucional, que uma ou várias instituições façam toda esta discussão numa altura em que, por lei, as candidaturas estão proibidas de reagir, por estar já terminada e ser proibida a realização de campanha eleitoral ou qualquer acto que como tal possa ser considerado. Não obstante, vários dos oradores são candidatos ou estão directa e imediatamente associados às forças políticas concorrentes a esta eleição.
O argumento mais forte é talvez o de que a Conferência foi marcada já se sabendo qual a data das Eleições Europeias em Portugal. A Decisão do Conselho 2013/299/UE, de 14 de junho de 2013, marca a data das eleições para o período de 22 a 25 de maio; em Portugal, por força da lei, a eleição tem de realizar-se ao domingo, pelo que seria forçosamente a 25 de maio. É sintomático, por isso, o argumento aduzido pelo Banco de Portugal (BdP), dizendo que disponibilizou no site informação sobre a Conferência a 27 de agosto de 2013 (http://www.bportugal.pt/pt-PT/OBancoeoEurosistema/Esclarecimentospublicos/Paginas/Eventos.aspx) e que “a data das eleições europeias foi anunciada pelo Senhor Presidente da República através de Decreto no dia 21 de março” (BdP, em resposta à CNE).
Por último, e como refere o BdP, estarão presentes cerca de 150 participantes, incluindo jornalistas especializados. Ora, não se pode ignorar o impacto mediático que a Conferência vai ter, quer a nível nacional, quer gerado pela dinâmica interna da mesma, cuja entourage é naturalmente também composta pela comunicação social especializada e que dará eco não só dos preparativos para o evento, como do conteúdo da mesma. Pretender que toda esta dinâmica não tenha impacto quer no período de reflexão, quer no dia da eleição, parece pura ingenuidade.
Sintomático do impacto social da Conferência é o clamor que esta gerou na opinião pública, de um modo transversal, com apelos ao seu adiamento. De facto, tudo podia ter sido evitado adiando o início da Conferência algumas horas, para a manhã do dia 26. Ignorar estes factos é pretender ignorar o mediatismo que o evento gera e vai ainda gerar, em período que se pretende de serenidade e paz social.
Concluindo, e na posse de todos estes elementos, é de lamentar em primeiro lugar que se tenha pretendido realizar a Conferência precisamente no dia das eleições e antes de encerrada a votação; por último, que os proponentes da iniciativa, com elevadíssimas responsabilidades institucionais, e conhecendo de antemão todos estes elementos, incluindo a data das eleições, tenham marcado a Conferência para coincidir precisamente com essa data, descurando os princípios eleitorais a observar.”